2.10.07

Retrato ...

Now this is not the end. It is not even the beginning of the end. But it is, perhaps, the end of the beginning (Winston Churchill)



Escrevi isto algum tempo, creio que não está bom por que estas palavras carregam muitos sentimentos ...

Retrato (autoria própria )

Ainda me lembro quando você me deu seu retrato. Feito em gesso era sem dúvida um lindo objeto de decoração.
Seguindo o conselho de minha avó, o coloquei em um lugar alto, seguro e com grande visibilidade.
Por muito tempo seu retrato ornamentou a paisagem de todos que vinham me conhecer. Combinava como nenhum outro com todos os elementos do ambiente.
Um dia porém percebi uma pequena rachadura no objeto. A rachadura mostrava um defeito estrutural, talvez comprometesse a obra. Sinceramente não liguei. O seu retrato já era parte integrante do dia e eu tinha muito apreço por ele. Não seria uma rachadura que me faria desistir dele. Aquela pequena rachadura também não era perceptível aos menos atentos olhares.
Para minha infelicidade a rachadura evoluiu e como um ovo se partindo fez com que seu retrato partisse-se ao meio. Fiquei perplexo, deveria jogá-lo fora, afinal não poderia ficar com algo tão desarmonioso. Mas era um presente e nada que com um pouco de cola e cuidado não pudesse resolver. Após duas horas e muito cuidado o objeto já estava arrumado e tinha uma aparência ainda melhor.
A rachadura era agora praticamente imperceptível.
Por mais de uma semana aquela peça pela qual eu tinha tanto carinho decorou o ambiente e me trouxe novas antigas recordações. Contudo conforme o tempo passava a cola ia derretendo devido ao efeito da mesma luz que atingia meus olhos e ao descolar seu retrato quebrou-se em mais pedaços do que antes.
Não haveria como arrumar!!!
Não haveria eu disse?
Após mais de quatro horas e muita cola tudo estava refeito. Dessa vez os consertos eram evidentes. Apesar de tantas evidências o seu retrato ainda continha tudo o que ainda me causava admiração quando você me presenteou. Não importavam as falhas já que os olhos que o viam só percebiam as qualidades.
Não vou negar. Esta foi uma das muitas e muitas vezes. Após este dia muitos foram os dias em que consertei esta peça. Antigas conexões se descolavam e novos pedaços necessitavam ser colados. Acabei por muito tempo vivendo em função deste objeto. Horas e horas retocando com tinta e colando.
Muito tempo depois pouco restou de tudo e retirei seu retrato da exposição na sala. Entretanto não o joguei fora, eu ainda o mantinha.
Quando da última vez que me visitou eu ainda o tinha ou melhor possuía o que restou dele. Havia um imenso carinho por ele. Escondi-o atrás da porta para que você não o visse.
Ao sair você bateu a porta. Seu retrato não resistiu a vibração da parede e caiu fragmentando-se em muitos, muitos e muitos pedaços.
Estava pronto para mais dias e dias, semanas e semanas colando, mas decidi que já era hora de jogá-lo fora.
Francamente já não havia naquela obra qualquer qualidade que me fizera recordar e me fascinar.
Joguei-o fora mesmo assim com muita tristeza.
Sinto-me com mais tempo agora para pintar o meu retrato, que é construído com material mais resistente e com muito menos chance de rachar.


Aquele abraço.
Até mais.

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